Jurisprudência

Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Outubro de 2014 (proc. nº 941/09.0TVLSB.L1.S1), relatado por Gregório Silva Jesus

Sumário:

  1. A prevalência do direito à honra e ao bom-nome, no confronto com o direito à liberdade de expressão e de informação, relativamente a afirmações lesivas do mesmo, não se compadece com as situações em que aquelas afirmações, embora potencialmente ofensivas, sirvam o fim legítimo do direito à informação e não ultrapassem o que se mostra necessário ao cumprimento da função pública da imprensa.
  2. O direito do público a ser informado tem como referência a utilidade social da notícia – interesse público –, devendo restringir-se aos factos e acontecimentos que sejam relevantes para a vivência social, apresentados com respeito pela verdade.
  3. A verdade noticiosa não significa verdade absoluta: o critério de verdade deve ser mitigado com a obrigação que impende sobre qualquer jornalista de um esforço de objectividade e seguindo um critério de crença fundada na verdade.
  4. Embora seja difícil estabelecer o equilíbrio ténue entre o princípio da presunção de inocência, de que todos os cidadãos devem gozar, mormente na fase de inquérito, e o direito à informação, é inderrogável o interesse em dar a conhecer aos cidadãos uma matéria que, encontrando-se porventura sujeita ao segredo de justiça, releva do cometimento de irregularidades graves passíveis de configurar a prática de crimes. Há interesse público.
  5. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) tem acentuado que a liberdade de imprensa constitui um dos vértices da liberdade de informação, não podendo as autoridades nacionais, por princípio, impedir o jornalista de investigar e recolher as informações com interesse público, e de as transmitir, o que é inerente ao funcionamento da sociedade democrática.
  6. No que toca ao confronto do segredo de justiça com a liberdade de expressão e de informação, o TEDH tem-se pronunciado contra as restrições à liberdade de expressão que não considera serem necessárias, designadamente quando as informações em causa já sejam públicas.

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Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de Março de 1993 (proc. nº 081988), relatado por César Marques

Sumário:

  1. De harmonia com o disposto no artigo 335, n. 1 do Código Civil, havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes.
  2. O direito de informar não é um direito absoluto que possa conduzir à total impunidade do jornalista.
  3. Tendo os réus, como jornalistas, atingido com os seus escritos o bom nome do autor, tal implica a reparação dos danos que causaram – artigo 484 do Código Civi l- cuja ofensa, por se tratar de um direito pessoal consagrado na Constituição, impõe que se atenda também ao dano não patrimonial – artigo 496 do Código Civil.

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Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Outubro de 2012 (proc. nº 2398/06.8TBPDL.L1.S1), relatado por Mário Mendes

Sumário:

  1. Em toda e qualquer acção cível para ressarcimento de danos provocados por factos – acções ou omissões – cometidos através da comunicação social, os responsáveis são os autores das peças divulgadas e a empresa proprietária do órgão ou estação difusora, desde que esteja provado que os factos danosos praticados pelo referidos autores (comissários) tenham sido no exercício das funções confiadas ao comitente.
  2. Para qualquer pessoa dotada de um padrão médio de razoabilidade e bom senso, apresenta-se como óbvio que a não fundada imputação, pública e reiterada, através de um órgão de comunicação social (no caso, um relevante canal de televisão) a um cidadão (em concreto um cidadão com demonstrada e reconhecida intervenção a nível cívico, público e político) de envolvimento em actos de pedofilia e envolvimento sexual com menores, ainda que objecto de posterior rectificação, constitui, no seu conjunto, muito mais do que meros incómodos destituídos de relevância jurídica.
  3. Tal imputação constitui uma grave lesão de aspectos essenciais dos direitos fundamentais de personalidade que atingem de forma marcante a honra e dignidade da pessoa e merecem a protecção do direito.
  4. Os danos morais ou prejuízos de natureza não patrimonial são, por princípio, insusceptíveis de avaliação pecuniária, uma vez que atingem bens que não integram o património material do lesado, e o seu ressarcimento deve assumir uma natureza fundamentalmente compensatória e acessoriamente sancionatória, não servindo para aqui o dano de cálculo, julgando-se adequado, no caso concreto, fixar em € 50 000 a indemnização devida a título de danos não patrimoniais sofridos pelo autor.
  5. A teoria ou princípio da causalidade adequada não pressupõe a exclusividade da condição determinante, no sentido de que tenha determinado por si só e exclusivamente o dano, entendendo-se, antes, a possibilidade de intermediação de outros factores que podem colaborar na produção do dano, factores esses concomitantes ou posteriores (relevância da causalidade indirecta ou mediata).
  6.  Nestas circunstâncias, apesar de a demissão do autor, a seu pedido, de cargo político que exercia e a consequente perda de rendimentos não ser consequência directa e imediata dos factos lesivos da sua honra, verdade é que tais efeitos não se teriam verificado se não fossem esses factos, havendo assim causalidade adequada entre os factos e o prejuízo patrimonial sofrido pelo autor.
  7. No domínio da apreciação da responsabilidade civil por actos praticados através da comunicação social importa ter em conta que o trabalho dos jornalistas nos operadores de televisão (tal como em geral acontece em todo o sector da comunicação social) é prestado num regime de relação juridicamente subordinada, sob orientação e supervisão dos órgãos próprios da hierarquia das empresas operadoras, sendo importante realçar que a decisão de transmitir ou não determinados programas, notícias ou conteúdos pertence exclusivamente ao operador, através do órgão por si designado, implicando esta circunstância, em primeira linha, a eventual ou potencial responsabilização da empresa operadora pela divulgação de factos violadores de direitos de terceiros.
  8. Estando-se perante uma situação onde não seja possível apurar a responsabilidade individual e subjectiva dos jornalistas que actuaram no interesse e por conta do operador de televisão, deverá a decisão ser ponderada e tomada por recurso ao disposto nos arts. 165.º e 500.º, n.º 2, do CC. Ou seja, havendo responsabilidade solidária entre a pessoa colectiva e o órgão, agente ou mandatário, responderá apenas a sociedade se não for possível determinar em concreto o agente culpado do acto.

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Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Janeiro de 2010 (proc. nº 1839/06.9TVLSB.L1.S1), relatado por Fonseca Ramos.

Sumário:

  1. Um dos limites à liberdade de informar, que não é por isso um direito absoluto, é a salvaguarda do direito ao bom-nome. Os jornalistas, os media, estão vinculados a deveres éticos, deontológicos, de rigor e objectividade.
  2. Assiste aos media o direito, a função social, de difundir notícias e emitir opiniões críticas ou não, importando que o façam com respeito pela verdade e pelos direitos intangíveis de outrem, como são os direitos de personalidade.
  3. O direito à honra em sentido lato, e o direito de liberdade de imprensa e opinião são tradicionais domínios de conflito.
  4. O sentido crítico dos leitores que seguem o fenómeno desportivo, mormente as discussões em torno do futebol, é exacerbado por questões de toda a ordem, já que o constante debate na imprensa escrita e falada, sobredimensiona a importância de questões que, numa sociedade onde os valores cívicos deveriam ser a preocupação maior dos cidadãos, são relegados para segundo plano pela constante evidência de acontecimentos distractivos, sejam os da imprensa desportiva, cor-de-rosa, ou quejanda.
  5. A crítica tem como limite o direito dos visados, mas não deixa de ser legítima se for acutilante, acerada, desde que não injuriosa, porque quantas vezes aí estão o estilo de quem escreve.
  6. No âmbito do desporto e do futebol os actores do palco mediático nem sempre convivem de modo são com a crítica, quantas vezes por culpa dos media que se dividem entre apoiantes de uns e antagonistas de outros, não mantendo a equidistância postulada por uma actuação objectiva, com respeito pelos valores da ética jornalística.
  7.  Não lidando bem com as críticas do Autor, o Réu pôs em causa a idoneidade pessoal e profissional daquele, afirmando “que era um opinador pago para dizer mal, diariamente, referenciando o seu nome e afirmando que se pagasse jantares, wkiskeys e charutos seria uma pessoa muito bem vista. O Autor foi, publicamente, apelidado pelo Réu, de jagunço que, notoriamente, é um termo injurioso. Segundo o “Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa”, jagunço significa – “valentão que serve de guarda-costas a fazendeiros”, “homem que serve de guarda-costas a fazendeiros e caciques”, “capanga”, “guarda-costas”, “pistoleiro contratado para matar”, […] pessoa torpe, reles, que vive de expedientes”.
  8. Qualquer leitor, medianamente avisado, colherá destas afirmações a ideia que o Autor, como jornalista, é um mau profissional, dado a influências em função de pagamentos e favores, o que é demolidor para o seu trabalho que deve ser isento, e para a sua imagem de pessoa que deve ser incorruptível e séria na suas apreciações, e também o lesa como cidadão que preza a sua honra.
  9. Criticar implica censurar, a censura veiculada nos media só deixa de ser legítima como manifestação da liberdade individual quando exprime antijuricidade objectiva, violando direitos que são personalíssimos e que afectam, mais ou menos duradouramente segundo a memória dos homens, bens que devem ser preservados como são os direitos aqui em causa, à honra, ao bom nome e ao prestígio social.

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Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 17/09/2009 (proc. nº 832/06.6TVLSB.S1), relatado por Cardoso de Albuquerque.

Sumário:

  1.  A lei ordinária, na salvaguarda do princípio constitucional do direito de todos os cidadãos ao bom nome e reputação e à imagem, consagrado no art. 26.º da CRP, protege-os contra toda a ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, nos termos amplos definidos no art. 70.º do CC. Essa protecção, pela via meramente civil, é exercida, normalmente, através da pertinente acção de indemnização no âmbito da responsabilidade civil extracontratual e de harmonia com os pressupostos previstos no art. 483.º, n.º 1, do CC, dispondo o art. 484.º que responde pelos danos causados, quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ao bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva.
  2.  A definição dos limites do direito à liberdade de imprensa, quando conflituem com outros direitos fundamentais e com igual dignidade, como o direito de qualquer pessoa à integridade moral e ao bom nome e reputação, obedece a determinados princípios consagrados na jurisprudência do STJ, do TC, bem como da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Entre estes princípios são de salientar o cumprimento, na divulgação das informações que possam atingir o crédito e bom nome de qualquer cidadão, das regras deontológicas que regem a profissão de jornalista, designadamente procedendo de boa fé na sua recolha e na aferição da credibilidade respectiva antes da sua publicação.
  3. Uma dessas regras deontológicas é a que vincula o jornalista a comprovar os factos que relate, ouvindo as partes com interesses atendíveis. Ou seja, as empresas que desenvolvem a actividade jornalística e os jornalistas que nela operam devem ser rigorosos e objectivos na averiguação da veracidade dos factos ou acontecimentos relatados, sobretudo quando sejam susceptíveis de afectar direitos de personalidade.
  4. Embora a liberdade de imprensa deva respeitar no seu exercício o direito fundamental do bom nome e da reputação, o jornalista não está impedido de noticiar factos verdadeiros ou que tenha como verdadeiros, em séria convicção, desde que justificados pelo interesse público na sua divulgação, podendo este direito prevalecer sobre aqueles desde que adequadamente exercido.
  5. O conceito de “verdade jornalística” não tem que se traduzir numa verdade absoluta, pois, o que importa em definitivo é que a imprensa não publique imputações que atinjam a honra das pessoas e que saiba inexactas, cuja exactidão não tenha podido comprovar ou sobre a qual não tenha podido informar-se convenientemente. Mas esta comprovação não pode revestir-se das exigências da própria comprovação judiciária, antes e apenas utilizar as regras derivadas das legis artis dos jornalistas, das suas concepções profissionais sérias, significando isto que ele terá de utilizar fontes de informação fidedignas, por forma a testar e controlar a veracidade dos factos.
  6. A densificação do conceito de boa fé na divulgação, pela imprensa, de notícias de factos não verdadeiros é de crucial relevo para ajuizar se os réus (jornalistas) dela poderão beneficiar, em termos de excluir a ilicitude duma conduta passível de violação do bom nome e crédito do autor, enquanto imputando a este factos que não se provou ter cometido e em si lesivos da sua reputação, revestindo alguma complexidade.
  7. De acordo com alguma doutrina, transportável para a responsabilidade civil, essa boa fé é composta dos seguintes elementos fundamentais: 1) os factos inverídicos têm de ser verosímeis, ou seja, têm de ser portadores de uma aparência de veracidade susceptível de provocar a adesão do homem normal e não só do informador; 2) o informador terá de demonstrar que procedeu a uma averiguação séria, segundo as regras e os cuidados que as concretas circunstâncias do caso razoavelmente exigiam, provando se necessário que a fonte era idónea ou que chegou a confrontar as informações com várias fontes; 3) o informador terá de demonstrar que agiu com moderação nos seus propósitos, ou seja, que se conteve dentro dos limites da necessidade de informar e dos fins ético-sociais do direito de informar, evitando o sensacionalismo ou os pormenores mais ofensivos ou com pouco valor informativo; 4) o informador deverá demonstrar a ausência de animosidade pessoal em relação ao ofendido a fim de que a informação inverídica não possa considerar-se ataque pessoal.

Link de Acesso: http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a2a6364e8eff37418025764700506658?OpenDocument&Highlight=0,jornalista

 

Acórdão n.º 634/2008 do Tribunal Constitucional, de 23 de dezembro de 2008, relatado por Joaquim de Sousa Ribeiro

Julga improcedente o recurso de deliberação da Comissão Nacional de Eleições pela qual se decidiu aplicar ao referendo local em causa neste acórdão o regime previsto no artigo 62.º da Lei Eleitoral da Assembleia da República, em matéria de direito de antena, quanto ao acesso às estações de rádio.

Link de acesso: https://files.dre.pt/2s/2009/02/037000000/0737907381.pdf

 

Acórdão n.º 292/2008 do Tribunal de Constitucional, de 23 de julho, relatado por Maria Lúcia Amaral

Não julga inconstitucional a norma que resulta da conjugação dos artigos 484.º e 483.º, n.º 1, do Código Civil e 14.º, alíneas a), c) e h), do Estatuto dos Jornalistas (aprovado pela Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro), interpretada no sentido de que, estando em causa o direito à informação, basta a verificação de culpa inconsciente ou abaixo da mediania do jornalista como pressuposto do dever de indemnizar por ofensa ao bom-nome de pessoa colectiva

Link de acesso: https://files.dre.pt/2s/2008/07/141000000/3272732737.pdf

 

Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de Mario de 2008 (proc. nº 08B1478), relatado por Salvador da Costa.

Sumário:

  1. A honra de uma pessoa é essencialmente o substrato moral e ético da sua existência, e a consideração social, bom-nome ou reputação são o resultado do julgamento dos outros acerca dela.
  2. A lei traça limites à liberdade de imprensa de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática.
  3. Na interpretação do conteúdo dos relatos jornalísticos, face ao direito à integridade moral de quem exerce a função jurisdicional, deve considerar-se o contexto circunstancial que os motivaram, o seu interesse jornalístico e do público, a sujeição das decisões judiciais à crítica e a distinção entre elas e as pessoas que as proferem.
  4. O relato objectivo da forma insólita do protesto de um cidadão, em greve de fome junto do tribunal, incluindo a motivação e um outro juízo moderado de valor por ele afirmados, não extravasa do direito e do dever de informar de quem o escreveu e publicou.
  5. Não se verifica o pressuposto da responsabilidade civil ilicitude da acção nos relatos jornalísticos que, objectiva e contextualizadamente interpretados, não se revelem idóneos a gerar a ofensa à integridade moral da pessoa que decidiu, embora esta tenha sentido compreensivamente essa ofensa e quem os escreveu tenha configurado esse sentimento.

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